Um dos mais fascinantes postais ilustrados da Islândia.
Água fria que vai para o oceano embala centenas de pedaços de gelo.
Contrabalança com o brilho de cristal de formas irregulares que se despediram do glaciar.
Em alguns momentos formam um bailado ao som do improviso.
O barco leva-nos a descobrir cada recanto. A beleza não está apenas no olhar. Talvez, mais, na nossa imaginação ao dar nome e forma a cada pedaço.
Demora a chegar. De carro, a partir de Reykjavik, são cerca de quatro horas.
O percurso é interessante e muito variado.
Num instante deixa-se o centro urbano de Reykjavik e passamos para um ambiente rural. Espaços verdes em longos vales cortados por cordilheiras enormes e escarpadas. Uma casa isolada. Um pouco mais à frente um povoado com meia dúzia de habitações e alguns anexos para animais e rações.
Muitas destas povoações foram construídas no sopé de montanhas muito altas e rochosas.
As habitações ficam protegidas do vento mas mete medo se há um desabamento de terras.
Cavalos andam à solta pelo campo. Aguentam bem o frio. Por vezes vê-se um tractor. Alguns transportam muitos sacos que estão espalhados pelo campo, com alimento para os animais no tempo do gelo.
No alto de uma colina, uma igreja isolada. Bonita. A construção destes templos, em muitos casos, deve-se a alguém, abastado, que decidiu presentear a comunidade.

Hveragerði
As principais povoações não são grandes. Algumas ruas com habitação, lojas, venda de combustíveis, oficinas, bancos, escola, farmácia.. Pouco mais. Em algumas destas povoações há restaurantes e alojamento para turistas. Tudo muito simples. As pessoas, as ruas, os veículos, as montras...
O estritamente necessário.
Uma cidade que fica num vale, Hveragerði, após uma descida sinuosa pela estrada é talvez a excepção. Maior, com espaços de lazer e públicos mais modernos e com um alojamento tipo bengalows mais sofisticados. Da estrada percebe-se que é grande e também com recursos mais sofisticados, como por exemplo enormes estufas que têm a particularidade de serem geotermais.

Fizemos duas paragens.
A primeira para ver uma enorme cascata. Skógafoss.
Com 60 metros de altura e 25 metros de largura.
Segundo a lenda, um dos primeiros colonos viking escondeu atrás da cascata um cofre com um tesouro.
Um espaço amplo, com cores alternadas entre o preto das pedras vulcânicas e o verde vivo da relva.
A encosta também tem os mesmos tons. O verde parece mais de musgo que cobre as pedras.
No centro, a corrente mostra a força da queda de água. Um ligeiro vapor de água acrescenta o tom romântico da cena.
Mesmo ao longe somos contagiados pela humidade transportada pelo vento. O som da queda de água também se estende por centenas de metros.

A segunda paragem foi mais ou menos a meio do caminho, numa zona aberta, terra de ninguém.
São uns vinte quartos, todos alinhados, com um restaurante e uma zona comum na parte central. Fica completamente isolado. No meio de montanhas.
Um pouco mais para a frente o horizonte altera-se.
As montanhas aproximam-se mais do mar. Terminam os vales.
Começam a surgir espaços mais pequenos dominados essencialmente por ovelhas. Às centenas. Brancas e, no meio delas, ganham destaque, as ovelhas negras. Afinal existem...
A estrada aproxima-se do mar e a costa tem muitas pedras lançadas pelos vulcões. Centenas e centenas de metros com vestígios das várias erupções.
Em alguns locais o vestígio é através de areais negros que são engolidos pelo mar.
Um rio rompe o lastro das cinzas dos vulcões. É como uma foto a preto e branco.

O brilho e a fluidez da água a contrastar com a natureza morta e negra das cinzas. Uma imagem que se prolonga num horizonte sem fim.
Virados para o interior conseguem-se ver alguns vulcões. Estão inactivos mas os geólogos dizem que não é por muito tempo. E assim foi. Pouco tempo depois, um destes vulcões provocou o caos no espaço aéreo europeu.
Começam também a surgir alguns glaciares.
Dá para ver ao longe.
Distinguem-se essencialmente pela cor e textura. Azul escuro e traços brancos perpendiculares. Enormes.
Parecem um manto que se desloca para o mar.

A chegada a Jokulsarion é fácil de identificar.
Um rio, uma ponte e pequenos blocos de gelo a navegarem em direcção ao mar.
Numa perspectiva cromática: negro das cinzas, quebrado pelo tom acastanhado da água e no meio pequenos blocos de branco puro.
Após a ponte há um desvio que nos leva para uma língua de terra. Com muitas pedras.
Alguns metros depois começa o espectáculo natural.
Uma lagoa do glaciar Breiðamerkurjökull com inúmeros pedaços de gelo.
Esta lagoa tem pouco mais de três décadas e formou-se devido ao contacto com o Oceano Atlântico. Tem uma área de cerca de 18 km2.

Formas diversas vão surgindo no meio da água.
De tamanhos, cores e texturas diferentes.
Não se estranha, por isso, que esta lagoa tenha isdo local de rodagem para vários filmes, entre eles Batman Begins.
Na terra há um pequeno bar e um barco que nos vai transportar.
Ao lado, um homem com uma lancha vai acompanhar-nos em todo o percurso.
O tempo estava cinzento e começou a escurecer.
Quando já estávamos dentro do barco a circundar os pedaços de gelo caiu uma carga de água muito forte.
A embarcação era pequena e não tinha qualquer protecção da chuva.
Vento e uma batida intensa de água tirou o prazer de saborear este momento único.
Nem guarda-chuva nos salvou. Uma molha monumental.

Eram muitos os pedaços de gelo que se separavam do glaciar.
Alguns enormes, tipo iceberg.
A forma e as cores incentivavam a nossa imaginação. Um cão. Um golfinho. Um tubarão. Uma serra. Uma caverna. Um cisne com outros mais pequenos a seguir.
Uma esfinge gigante a chorar.... Dependia do nosso olhar criativo.
Alguns espraiavam-se na água e flutuavam com facilidade. Uma estrutura horizontal alinhada com a superfície da água.

Outros, por não se conformarem com esta situação, pretendiam dar um salto ou levantar voo. Rebeldes. Davam gritos para o céu.
Havia ainda os estáticos, os maiores, e a ideia de movimento era apenas dada pelo voo de uma ave.
Um azul muito denso era quebrado por linhas castanhas ou pretas, perpendiculares, ou por uma significativa alteração do brilho.
Outros tinham a textura do gelo normal, quase transparente ou de cristais de açúcar com brilho intenso enquanto não se dissolvia na água.
Pareciam ser os preferidos das aves para descansarem.

A maioria eram completamente opacos, com concavidades. Escondiam algo. Ou na linha de água ou mais acima. Ligeiras ou tipo grutas.
Com corte geométrico, feito a regra e esquadro ou aleatório.
Formas repetidas, tipo bunker ou únicas, tipo Eduardo mãos de tesoura.
Havia ainda os híbridos ou um casal abraçado. Numa parte uma textura lisa e transparente, noutra parte granulada e opaca.
Outra curiosidade, é que parecia um bailado onde cada pedaço sabia a sua posição e movimento.

Não chocavam. Quanto muito, um ou outro amparava-se num bloco maior.
Na mesma perspectiva conviviam pedaços enormes com outros mais pequenos e de cores muito diferentes.
Os reflexos na água esbatiam as diferenças de tamanho ou de cor.
A água é verde escura e dá realce a estas cores.
A sensação dos passageiros era de espanto.
Pela chuvada que repentinamente se abatia sobre nós e pela paisagem deslumbrante.

Um apontava para um pedaço e logo a seguir o nosso olhar deslumbrava-se com uma outra forma que se aproximava do barco.
Lentamente o homem do leme orientava-se pelo meio dos pedaços de gelo.
Fazia várias vezes ao dia este percurso.
A única preocupação é que os passageiros não se concentrassem num dos lados da embarcação.
A outra, suponho eu, era ver claramente o caminho devido à chuva intensa.

Quando saímos estávamos todos um pingo. De alto a baixo. Molhados e com frio.
Foi uma correria para o bar. Era rústico mas determinante para o nosso bem estar.
Em primeiro lugar as bebidas quentes conseguiram retemperar a temperatura do corpo. Chocolate quente. Não há melhor.
Depois, a casa de banho deu imensa ajuda. Consegui tirar alguma humidade do calçado.
Serviu também de primeiro socorro para a Nikon.
Salvou-se, ainda estou para acreditar.

O conforto de uma boa notícia: a chuva e o tempo cinzento tem um ganho - os pedaços de gelo têm uma cor mais intensa, essencialmente o azul.
Apanhámos uma molha mas conseguimos ver os blocos de gelo de uma forma mais viva e colorida. Ao mesnos isso.
No regresso, foi abençoada uma paragem em Vik, (a 180 km de Reykjavik) no restaurante Stronolin que tem uma loja de souvenires.
A salvação da gripe para alguns de nós.

Meias, camisolas e blusões foram compras de última hora para substituir a roupa molhada que ainda resfriava o nosso corpo.
Ao mesmo tempo, com o corpo já aquecido, deu para dar um breve passeio e contemplar o final da tarde.
É uma zona montanhosa, próximo do mar.
O nevoeiro tapava o topo das montanhas. Uma mistura de verde e cinzento.
No sopé de uma montanha um empreendimento turístico.

No alto uma igreja com telhados vermelhos, entre o verde da encosta e o azul do céu.
A chegada a Reykjavik foi já à noite. Uma sopinha quente para aquecer....
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