A noite foi má. Não fui o único. O soroche foi o pesadelo de vários hóspedes recém chegados a Cusco.
Tomei os famosos sorojchi pills, um fármaco peruano que tinha comprado em Lima como prevenção para o mal da altitude. Nada feito. Chá de coca também não ajudou muito.
Ao longo da noite surgiram dúvidas sobre o embate da altitude com a viagem. Vai não vai. Decidi continuar o programa e antes das 6h toca a levantar. Machu Picchu estava à minha espera!
Mas não havia modo de acertar. O dia (domingo de Páscoa) começou mesmo mal. Água quente para o banho não havia. Ao final do dia, na receção do hotel Royal Inca II explicaram que se tinha de esperar uns minutos. O pequeno-almoço teve de ser a correr. Mais chá de coca.

David, o taxista levou-me à estação da PeruRail.
Parte do percurso de trem até Machu Picchu estava em obras e a viagem teve de começar num autocarro.
De comboio o único acesso a Machu Picchu é através da Peru Rail. Convém comprar o bilhete com antecedência porque esgota com facilidade.
A compra pode ser feita online e em vários pontos de venda no Peru. Atenção: antes de comprar o bilhete do comboio tem de articular com o ingresso ao parque de Machu Picchu, que também tem acesso limitado. A compra do bilhete pode ser feita com antecedência no site do Governo. Mas deu problema com o sistema de pagamento. A alternativa (com sucesso, sem qualquer problema, pelo mesmo preço e com processo de confiança) foi feita online, num site especifico para compra de bilhete. Por contato de e-mail, fiquei a saber que este site tem uma ligação física com uma agência de viagens peruana. O que me deu mais confiança.
Uma outra possibilidade de viajar no Vale Sagrado é através do Inca Rail. Mas primeiro tem de chegar à região de Machu Picchu porque o itinerário é apenas entre Ollantaytambo e Machu Picchu.
O pessoal do Peru Rail é muito simpático. A empresa tem como "target" os turistas, funciona há mais de uma década e tem acionistas da Orient Express.

A viagem de autocarro começou com uma subida acentuada pela serra que circunda Cusco.
Quanto mais longe do centro, maior a pobreza. Lixo, casas meio acabadas, barracas, oficinas de não sei o quê. Uma mulher urina para um penico à beira da estrada. Muitos cães partilham o território e o lixo.
Apesar destes sinais, o nascer da manhã é belo, no topo da montanha. Ao longe, uma bruma tapa o vale onde Cusco desperta.
Do outro lado da montanha é o verde das plantações e do mundo rural.
O transbordo por autocarro demorou cerca de duas horas. A mudança é feita perto de um desfiladeiro. Uma montanha íngreme, que é muito utilizada para alpinismo. Lá no alto estão "pregadas" na escarpa três "naves" de fibra que servem de abrigo quando surgem tempestades.

A viagem de comboio foi num Expedition. Hiram Bingam é o nome do comboio. A referência é ao explorador norte-americano que no início do século XX, com a ajuda de locais, descobriu Machu Picchu.
O caminho é fantástico. Uma obra de engenharia que rompe pelos desfiladeiros andinos. Selva densa, escarpas enormes, as carruagens a estreitarem para passarem por meio de uma ravina, ao longe pequenos lugares agrícolas com animais de pastoreio...
Com a chegada ao lugar de Machu Picchu tudo muda. As casas e lojas quase que invadem a linha do caminho de ferro. Tudo vive do turismo. A estação de comboios, os treks, lojas, restaurantes, vendedores ambulantes, agência, autocarros para o parque... Um frenesim.

O acesso ao parque arqueologico é feito por um autocarro. Também se pode ir a pé... só para alguns. Na saída da estação, vira-se à direita, e ao fim de uma subida de poucos metros há um ponto de venda de bilhetes. Compre ida e volta.
Os autocarros circulam com grande frequência e demoram cerca de 20 minutos a chegar ao parque. É uma subida em ziguezague.
Obrigatório água e um protetor para a poeira. A máquina fotográfica em punho dá para apanhar boas fotos.
O percurso pelo parque exige tempo, energia, água, protetor solar, um chapéu e pouco peso. Pode-se deixar a mochila na entrada (compensa o preço), há guias a oferecerem os seus préstimos e depois é escolher o caminho...
Optei por fazer o percurso contrário ao habitual. Foi bom porque deu para intercalar e perceber outros caminhos. Foi mau porque a subida que os guias fazem tem muito mais sombra. Ver pessoas de idade a fazer esta subida causa espanto. Escadas estreitas, irregulares e escorregadias. Como vão chegar à guarita de segurança, lá em cima?! É caminhar, caminhar...

Em alguns lugares históricos, de património extenso, quando chego a reação é UAU! Foi assim à entrada de Petra, Angkor....
Vou fazer muito inimigos. Em Machu Picchu não foi assim.
A sensação é: igual às fotografias. Não me surpreende.
De início, o espaço parece mais pequeno do que imaginava. No entanto, ao caminhar, com as várias encostas e construções, acabo por perceber que é mesmo grande e, reconheço, soberbo.
Aqui pode encontrar informação detalhada sobre Machu Picchu. Como foi construído, o que significava para os incas, os melhores percursos. Não só sobre o parque mas de toda a região chamada de Vale Sagrado.

Visitar este espaço sem essa informação é muito redutor.
Uma alternativa é “encostar” a um grupo acompanhado de um guia. Há por todo o lado. E não é difícil porque, ao fim de algum tempo, os turistas preocupam-se mais em escolher planos para as fotografias e selfies do que ouvir a informação do guia.
Uma outra consequência de quem faz a visita sem o guia é descobrir o caminho de regresso. Com insistência tem de se responder à pergunta: qual o caminho mais curto para a saída?
Um cachorro quente e um sumo de laranja foi o almoço. Mais um sorojchi pills para a altitude.
O regresso a Cusco já é mais cansativo. Muitos deixam o parque pouco depois do almoço para apanharem o trem de regresso. Forma-se uma fila enorme para conseguir lugar no autocarro que leva os turistas até ao comboio.

A estação de caminho de ferro em Machu Picchu fica em outro lugar. Mais acima e muito próximo de um mercado de roupa e artesanato.
Vale a pena percorrer a pé o local. O rio, as pontes e as pessoas constituem motivos interessantes. Ao entardecer são fantásticas as imagens.
O regresso no Vestadome já tem o peso da jornada. A viagem é quase toda de noite.
Dão um snack e alguns minutos de entretenimento para descomprimir da viagem.
Muitos aproveitam para pôr o sono em dia.
À chegada a Cusco é noite cerrada. A estação fica um pouco longe da zona histórica. O melhor é um táxi e andar a pé não é fácil.
O cansaço é grande e a altitude não ajuda.
Amanhã, bem cedo, regresso à estação e à Peru Rail.
Fotos do Peru